Ésquilo, dramaturgo
Teatro Grego Parte2

Ésquilo, dramaturgo

História do Teatro | Ésquilo, dramaturgo

Texto: Cristina Tolentino
cristolenttino@gmail.com

 

Ésquilo, dramaturgo grego

Ésquilo

O coro nas Suplicantes de Ésquilo

Ésquilo (Aichylos) nasceu na cidade de Elêusis, pelo ano 525ª.C. O que de seguro se conhece sobre a sua existência é ter sido combatente no campo de Maratona e nas águas de Salamina.

Era inevitável que nunca esquecesse sua participação nesta grande luta, ao lado dos homens de seu povo e de seus irmãos, um dos quais foi condecorado por valor e bravura em Salamina.

Cada gênio revela um padrão de comportamento. O padrão do primeiro grande dramaturgo, tal como o de diversos dos seus companheiros posteriores, foi o de estar sempre colocado entre dois mundos ou princípios.

O que ele vai mais tarde transpor para as suas peças é parcialmente seu, em virtude de estar vivo num dos períodos críticos da história humana.

O clima e as relações entre os gregos e os persas tornaram-se cada vez mais tensas. Mesmo quando os persas foram derrotados, a Grécia começou a se encaminhar para uma nova crise.

Sua Cidade-Estado torna-se um império. Atenas começa a adquirir mais poder do que lhe é possível utilizar com discrição. Observando também o declínio de um grande império como a Pérsia, foi levado, acima de tudo, a meditar sobre o destino das nações e dinastias.

Dentro da própria Grécia havia uma luta local entre a aristocracia e as massas compostas de cidadãos atenienses. Sem dúvida alguma, a política o absorveu com intensidade maior do que jamais podemos saber. Não obstante, é sua abordagem à religião e à ética, que mais afetou a qualidade e significado de suas tragédias.

Seu primeiro aprendizado fora a imersão nos ritos e especulações místicas de Elêuses, a cidade onde nascera e, na qual, muito cedo o iniciaram na adoração à Mãe e deusa da Terra, Deméter.

Os gregos consideravam Ésquilo como um homem intoxicado de deuses que conseguia seus efeitos por inspiração. Nenhum dramaturgo se encontrou com tanta freqüência nas encruzilhadas.

Ésquilo ganhou por treze vezes, o primeiro prêmio nos concursos dramáticos da Ática. Autor de cerca de noventa peças, destas somente sete chegaram aos nossos dias.

Embora em número reduzido, no conjunto é como se fossem uma amostragem representativa de alguns dos aspectos mais importantes da tragédia: a exploração em profundidade da mitologia; a riqueza significativa de cada mito eleito; um alto padrão literário como instrumento do teatro. Ésquilo morreu em 456 a.C., em Gela, Sicília.

As Tragédias de Ésquilo

Os Persas foi escrita em 472 a.C., oito anos após a batalha de Salamina e valeu o primeiro prêmio ao seu ator.

O dramaturgo patriota exulta com a independência do povo grego, ao mesmo tempo em que não exalta o vencedor, nem os vencidos e em nenhum momento depõe a dignidade dos mesmos.

Tratando da derrota dos persas comandados por Xerxes, gira também em torno da recepção das novas pela corte imperial. O coro descreve a magnificência do exército, mas expressa ansiedade quanto a sua segurança.

Subitamente chega um mensageiro com o relatório da catástrofe. Ansiedade e orgulho lutam no íntimo de Atossa, a rainha-mãe, enquanto o arauto narra as minúcias da tumultuada derrota.

Após uma longa pausa, ela fala: “Por longo tempo fiquei silenciosa. Quem foi que não caiu?”

O mensageiro a compreende e replica que seu filho Xerxes, o rei, está a salvo. A esta cena vigorosamente construída, segue-se uma invocação fantástica, quando o fantasma de Dario, o pai do rei derrotado, é chamado do reino dos mortos para prever o futuro.

Dario profetiza novos desastres e adverte seu povo contra o tremendo pecado da Hubris, ou orgulho, que invariavelmente é punido pelos deuses. Após esse episódio, que pode muito bem ser descrito como a primeira cena de fantasmas dentre os dramas que foram conservados, entra no palco o próprio Xerxes.

O filho degenerado de um pai valoroso está moralmente aniquilado e a peça termina com um longo lamento oriental pelo exército destroçado.

Em Prometeu Acorrentado, Ésquilo nos traz uma tragédia transbordante de beleza, reflexão, transfigurada por essa personalidade inspiradora, rebelde contra Zeus e amigo do homem.

Prometeu é o primeiro humanista e rebelde a ser apresentado no teatro. Sua tragédia é o protótipo de uma longa série de dramas sobre o liberalismo.

Quando a tragédia tem início, o titã está sendo acorrentado a um pico nas montanhas do Cáucaso pela “Força”, pela “Violência” e pelo deus-ferreiro Hefaistos.

Ficando a sós, Prometeu dirige-se à natureza e, sobretudo à sua mãe, Têmis ou Terra – primeiro monólogo teatral que chegou a nós.

Possuidor do dom da “previsão” sabia o que deveria suportar se levasse o fogo aos homens e tornasse possível sua sobrevivência e libertasse o seu temor.

O desafio de Prometeu a Zeus, é por este severamente punido e desde o início o herói sofre o castigo que lhe fora imposto. Através de Prometeu, os homens conquistaram suas mentes, recebendo dele o seu método de salvar a humanidade através das artes e da indispensável ciência da cura dos corpos.

Prometeu diz que se Zeus desposar uma mulher cujo nome ele não revelará, a criança que nascerá dessa união acabará por derrubá-la do trono. Os emissários de Zeus exigem que o titã revele o mistério da futura derrocada do vencedor.

Prometeu se recusa e é tragado por uma convulsão da natureza – um abutre que se alimenta do seu fígado. A dramaticidade em dimensões extra-humanas e uma projeção épica dos incidentes marcam a obra.

Trilogias

Nas duas últimas de suas trilogias subsistentes, Édipo volta-se do drama de Deus para o drama do homem.

Na primeira delas, uma tragédia de Édipo, com a qual ganhou o prêmio trágico em 467 a.C., o tema é a Até doméstica, isto é, a maldição familiar associada à história primitiva do Estado tebano.

A maldição começa com Laio, bisneto de Cadmo e Harmonia, filho de Labdacos. Durante a menoridade de Laio, o reino de Tebas caiu em mãos de usurpadores, e Laio teve de se exilar em Élide, junto ao rei Pélops.

Aí, apaixonou-se pelo filho desse, o jovem e belo Crisipo, e inventou os amores contra a natureza. Pélops o amaldiçoou e expulsou. Tendo morrido os usurpadores, Laio voltou a Tebas e reconquistou seu reino, mas trazia consigo a maldição de Pélops.

O oráculo revelou-lhe que estava proibido de engendrar um filho. Se o fizesse, o filho o mataria e seria causa das mais terríveis desgraças para toda sua família.

Laio não deu ouvidos e engendrou Édipo. A maldição se realiza terrivelmente na estória de Édipo, que não sabendo de quem se trata, mata Laio, seu pai, casa com Jocasta, a mãe e dela tem filhos.

E contínua nos filhos deste casamento incestuoso quando os dois filhos de Édipo se matam mutuamente numa luta obstinada pelo poder.

Meditando sobre a primitiva história do homem, raiada de sangue, Ésquilo, recusou as explicações pré-fabricadas. Passando em revista o longo registro de parricídios, incestos, fratricídios e conflitos políticos, Ésquilo foi além da convencional teoria grega da maldição familiar.

Mas faz questão de deixar claro em O Sete Contra Tebas que a hereditariedade é pouco mais que uma predisposição. Os crimes cometidos pelos descendentes de Laio são resultado da ambição, rivalidade e insuficiente predomínio da lei moral durante a idade legendária.

Após a morte de Édipo, é a maldição da casa de Laio, assunto de várias tragédias. Movidos pela sede de domínio, Eteocles e Polinices, filho de Édipo, lutam pela posse de Tebas, depois de firmado um pacto de revezamento no poder, que Polinices não cumpriu.

No confronto, matam-se mutuamente. Todas as cenas são como que uma preparação para o final, quando os dois cadáveres são conduzidos ao palco, acompanhados de Antígona e Ismênia, as irmãs dos mortos.

A penúltima cena é um tocante lamento de suas irmãs, Antígona e Ismênia, e pelo coro de mulheres tebanas. Choram o fim de uma dinastia e insultam a luta pelo poder:

“Pela terra bateram-se, e exigiam
Uma igual partilha.
Bem fundo no solo, onde jazem agora,
Não há mais terra a desejar.”

Antígona observa, “A discórdia é a última das deusas a terminar seu conto”, e um novo conflito é indicado no encerramento da tragédia. Ésquilo estava galgando novas intensidades em OS SETE CONTRA TEBAS ao voltar-se para a tragédia humana e individual.

Vem, por fim, a sua última e maior trilogia – A ORÉSTIA , que é qualificada como “a maior criação do espírito humano”.

Ésquilo a compõe aos 66 anos, em 458 a. C.
Em Agamêmnon, o primeiro elemento da trilogia, o herói mítico retorna a Argos, em companhia de Cassandra, após a vitória sobre Tróia, somente para ser assassinado por sua esposa Clitemnestra, com a cumplicidade do amante Egisto.

Depois, em As Coéforas, o crime inicial produz as suas conseqüências: A Vingança. Orestes retorna a Argos para vingar a morte do pai, Clitemnestra é assassinada e o filho se dá conta da gravidade do crime que realizara. Invoca a proteção dos deuses que ordenou o surgimento das FÚRIAS.

Esses espíritos vingadores despertados pelo matricídio levam-no à loucura pelo terror e pelo remorso. Em as Eumênides, a justiça do sangue pelo sangue é substituída pela benevolência da deusa Palas Atena – deusa da razão que põe fim à cega e autoperpetuadora lei da retribuição, advento de uma nova era, uma nova ética, presidida pela razão e a benevolência.

Orestes é julgado por um tribunal a cuja cabeceira a deusa tem assento, e é absolvido. Aplacam-se as Fúrias que o perseguiam, recebem o nome de Eumênides e a maldição da Casa de Atreu chega ao fim.

Além da introdução do segundo ator (deuteragonistés) na tragédia, credita-se a Ésquilo a adoção da máscara, da indumentária trágica, do cortuni (botas com suas grossas solas), assim como inovações na decoração e nos mecanismos cênicos.

Ésquilo transformou o ritual em drama, trouxe a personalidade humana para o teatro e incluiu a visão espiritual do drama. Deu inicio à magnificente marcha da tragédia.

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