Pina Bausch, biografia
Dança Contemporânea

Pina Bausch, biografia

Dança Contemporânea | Pina Bausch, sua biografia

Pina Bausch e a Dança - Teatro

pina bausch

Texto: Evelyn Tosta

O nome de Pina Bausch é associado diretamente à sua condição de criadora da “ Dança-Teatro” contemporânea, representada pela fundação e direção da sua companhia Wuppertal Tanztheater, desde 1973, na cidade de Wuppertal, na Alemanha.

A expressão “Dança -Teatro” ( “Tanztheater”, em alemão) tem como definição mais universal “a união genuína da dança com alguns elementos do teatro, criando uma nova e única forma de dança, na qual a maior referência é a realidade humana.”

O termo já tinha sido usado anteriormente na Alemanha ,entre 1910 e 1920, por alguns membros do movimento Expressionista de dança, que pretendiam distanciar esta nova forma de arte, das tradições do ballet clássico; entre eles, o pioneiro e o mais importante representante desta corrente de pensamento: Rudolf Von Laban. Posterior à ele estão Mary Wigman e Kurt Jooss, antecessores de Pina Bausch, de quem ela herda influências.

Ao longo de suas mais de cinco décadas de criação, este estilo de se fazer dança, mantém quase sempre a mesma essência: Baseia-se no elemento humano e procura ser uma arte com um maior papel pessoal, que prima pela sensibilização e reflexão do público.

Numa performance que combina: dança, canto, diálogos, uso de personagens, cenários e figurinos; situações específicas como: medos, tristezas e outros conflitos humanos são apresentados com um propósito; unidos a todos estes outros elementos, como um amálgama.

Mas é a personalidade de cada coreógrafo, suas histórias, vivências, experiências , que vão dar à suas obras, um traço bastante peculiar, seja para imprimir o peso ou a leveza daquilo que pretendem retratar.

Os trabalhos de Pina Bausch , por exemplo, já foram apresentados no mundo todo, inclusive no Brasil. Por onde quer que passem, deslumbram e emocionam platéias, deixando verdadeiramente tocado quem os assiste.

É por este motivo, que a ela já foram dedicados muitos livros, fotos, documentários, monografias, teses, dissertações e filmes. Mas que traço marcante e especial existe em sua maneira de criar ? Para entender a importância de Bausch para a dança, é preciso conhecer a sua sensibilidade, talento artístico, trajetória , pensamentos e seu particular processo de criação.

Biografia, Pina Bausch

pina bausch

Pina Bausch, cujo nome verdadeiro é Phillipine, é uma mulher incansável, magnética e determinada. De personalidade introvertida, conversa pouco, mantém o semblante compenetrado, em suas entrevistas e tem sempre entre seus longos dedos, um cigarro, seu grande vício. “Amo dançar porque sempre tive medo de falar”, ela coloca.

Persistente,se auto-define como alguém que “ nunca desiste”, qualidade esta, típica de uma personalidade genial. Nasceu em 27 de Julho de 1940, na cidade industrial de Solingen, na Alemanha. Seus pais, eram donos de um modesto restaurante, anexo à um pequeno hotel, no mesmo local. Cedo, colocaram sua filha na aula de ballet.

Aos 14 anos, Bausch ingressou na escola Folkwang, em Essen, dirigida pelo maior e mais influente coreógrafo alemão da época- Kurt Jooss, a quem ela carinhosamente chama de “ Papa Jooss”. Para a jovem Philippine , foi quase inconsciente sua decisão de seguir os estudos de dança. E se a sua decisão se transformaria em carreira profissional, naquele momento, não foi para ela o mais importante.

“Eu não pensei muito sobre isto. Possivelmente isto acabou acontecendo sozinho. Eu sempre tive muito medo de fazer alguma coisa, mas eu gostava muito de fazer dança. E mais ou menos no final da escola quando a gente pode ou deve escolher o que vai ser, porque sabe que a escola vai terminar – então já estava claro para mim: iria estudar dança.” (BAUSCH, Pina. In. PEREIRA, 2007)

Nos quatro anos em que fez dança com Kurt Jooss, muito aprendeu. A escola Folwang era especial e nela se estudava quase tudo, ópera, pantomima, teatro, artes gráficas, fotografia e escultura. Além disso, Jooss, como coloca Bausch era “ Como um pai, um homem muito amável, cheio de humor e alegria pelas coisas, pelas pessoas. Ele sabia muito sobre história, música e teatro.”

Bausch se graduou no ano de 1958 e aos 19 anos, foi uma das poucas estudantes alemãs a conseguir uma bolsa de estudos em Nova York, no Juilliard School of Music. Nos EUA teve a oportunidade de vivenciar um intenso movimento de dança moderna, ao contrário da pacata cidade de Essen, trabalhando com coreógrafos renomados como José Limon, Antony Tudor, Alfredo Corvino, Maragaret Craker, dentre outros nomes.

Tornou-se membro do Ballet de Nova York e do Ballet da ópera Metropolitan, mas foi a cidade de Nova York, por ela mesma, por suas multi-faces e estilos de vida, que impressionaram fortemente Bausch. Ela sentia que o rumo de seu futuro seria guiado pelos dois anos que viveu lá. Como em suas próprias palavras “ Nova York é como uma selva, mas ao mesmo tempo, ela dá um sentimento de liberdade total. Em dois anos, me encontrei”.

No ano de 1962, Bausch retorna à Alemanha ingressando-se como solista no Ballet de Folwang. Onze anos depois, em 1973, foi convidada para torna-se diretora do teatro municipal de Wuppertal, onde nasceu a companhia.

No começo as coisas foram difíceis, pois o público não compreendia a linguagem coreográfica de Bausch, achavam-na rebelde e com ausência de dança. Entretanto, ela não se intimidou e seguiu adiante com seus ideais. Encontrou em Rolf Borzik, um aliado. Designer, com quem foi casada e teve um filho também chamado Rolf, que atua na área da música. Em 1980, Bausch tornou-se viúva.

Wuppertal, onde se situa a sua companhia, é uma cidade relativamente rica. Ela abriga a indústria química de pesticida da Bayer e é ainda a terra natal do chefe de governo do estado, Johannes Rau.

Estes fatores associados, contribuíram e contribuem para que o Wuppertal Tanzteather receba generosos patrocínios, totalizando cerca de 3.7 milhões de deutschemarks ($3 milhões) por ano. Além disso, o ambiente de Wuppertal, instiga a criação artística, com sua atmosfera surreal e fascinante, como por exemplo, os trilhos ferroviários flutuantes.

Desde que assumiu a direção da companhia de Wuppertal, Bausch tem composto trabalhos maravilhosos que despertaram e continuam despertando a atenção de profissionais e apreciadores da dança em todo mundo. Entretanto, infelizmente, a Wuppertal TanzTeather não oferece ao público workshops nem promove ensaios e/ou aulas abertas.

Wuppertal Thanzteather e o processo de criação de Pina Bausch

Wuppertal Thanzteather

As obras de Bausch emocionam e deixam o público tocado, o que em parte se justifica pela maneira como ela as realiza. Em seus trabalhos, que são uma junção original de teatro e dança, individualidade e universalidade dialogam, havendo sempre uma valorização do elemento humano.

Esta valorização se constata pela participação ativa de seus atores-bailarinos dentro do processo de criação , no qual não contribuem apenas como intérpretes, mas principalmente como sujeitos, possuidores de corpos psicológicos, afetivos ,técnicos e culturais; corpos que contam histórias, que possuem experiências, que não devem ser desprezadas.

Partindo do princípio de que cada um destes bailarinos tem a sua própria voz, o que dizer que cada um tem a sua própria verdade, Pina Bausch adentra o mundo subjetivo de cada um deles buscando riscos, divagações, emoções, memórias, sonhos e medos. Através de verdadeiros bombardeios de perguntas, ela os instiga a darem respostas verbais, gestuais e corporais a tais situações. Desta forma, ela evoca sensações, articula sentimentos, faz e desfaz uma trama de agressões, carícias, revoltas, ternura, desejos, alegrias, dores e complexos.. As perguntas que lança, muitas vezes são difíceis de responder, por exemplo, “ Faça alguma coisa que te deixe envergonhado” , “ Mova a parte favorita do seu corpo”, “ Como você se comporta quando perde alguma coisa?”, “ Escreva seu nome com um movimento”, dentre outras.

Seus trabalhos misturam diálogos, canto, circo, ginástica, brilhantes impactos visuais de figurino, cenografia e iluminação. A universalidade de suas obras vem da sua maior fonte de inspiração, que são as relações e os sentimentos humanos. Os assuntos de seu interesse são a vida cotidiana, as pessoas nas ruas, com seus respectivos comportamentos; seus medos , solidão, amores, tristezas, saudades. De certa forma, o que Bausch retrata é sempre um pouco da alma humana e da batalha dos sexos.

Para criar, Bausch parte sempre de um estudo, através da inserção dentro dos ambientes, da observação, do envolvimento com as pessoas, com as situações, num período de conhecimento e coleta de informações, ao qual ela denomina de pesquisa de campo. Neste processo, tanto a coreógrafa como os seus intérpretes, têm grande liberdade para agir e reagir como sentirem que seja mais adequado, e desta maneira surgem as mais variadas situações, que são levadas em cena.

Bausch trabalha sobre a concepção de que a criação surge a partir de pensamentos, uso de textos, repetições de células coreográficas, tudo em conexão com a vida pessoal de seus bailarinos. Não parece ser proposta dela , que sua forma de coreografar seja codificada, preferindo sempre deixar espaço para certa subjetividade na sua forma de compor a dança.

A criação é realizada como um quebra-cabeças. Após o período de pesquisa de campo, os bailarinos respondem à uma série de perguntas sobre aquilo que viram, e a partir daí, muitos gestos e movimentações surgem. Bausch os instigam a pensarem e encontrarem formas diferentes de se expressarem, incentivando a criatividade e a imaginação. Simultaneamente , ela faz anotações e registra todo o processo com uma câmera de vídeo.

Outra característica marcante dentro do processo criativo de Bausch, é a repetição das ações, como um meio de criar no intérprete e conseqüentemente na platéia, sentimentos, significados e experiências diversificadas. Esta repetição aparece, segundo Bausch, como um instrumento criativo por meio do qual os bailarinos reconstroem suas próprias histórias como corpos dançantes. Inicialmente, esta repetição aparece como uma maneira de reconstruir as experiências passadas dos bailarinos e esse processo não está baseado na expressão de um sentimento real, presente, mas na tradução simbólica de sentimentos passados, que por meio da extensiva repetição são moldados em um forma estética.

Bausch orienta a sua criação, pelo aproveitamento da experiência corporal e afetiva de seus bailarinos. Suas obras originam-se a partir da formulação de questões formais ou pessoais aos mesmos, da observação, do uso da imaginação e do convívio com a realidade inspiradora; fatores que somados, contribuem para dar um caráter genuíno em seus espetáculos.

O diferencial de seu trabalho está no fato de que ela valoriza o elemento humano como o alvo principal da criação. Sua pesquisa privilegia os corpos, suas vivências físicas e emocionais e não um texto dramático, como no teatro, ou um libreto, como no ballet clássico.

Características das obras de Pina Bausch

bailarinos da companhia Pina Bausch

As obras de Bausch são multi-facetadas e criadas a partir de propósitos curiosos, misturas irônicas e muita sensibilidade, geradas a partir da experiência de vida de seus bailarinos, mediadas por seu típico jogo de perguntas.

Em suas apresentações, os bailarinos da companhia estão quase sempre vestidos em elegantes trajes, preparados como para que um grande evento. A repetição de movimentos simples ou frases de movimentos também é um traço característico de seus trabalhos e servem para intensificarem as tendências físicas e emocionais da coreografia.

Temas comuns como a dicotomia inerente nas relações entre homem e mulher, assim como o individual e o grupal, o maligno e o benigno, a comédia vesus a tragédia, é mostrado de uma forma sutil e com bastante criatividade e imaginação.

Não parece ser difícil responder ao trabalho de Bausch- ele é real, desconcertante, confuso, intrigante, como a própria vida. E isso é o que faz com que o público se identifique, tanto com os sentimentos mais dolorosos quanto os mais sutis. Eles são um convite à reflexão, porém sem qualquer julgamento ou atitude moral, mas com um senso de honestidade sobre o que se propõe retratar.

Mais do que qualquer outro coreógrafo deste século, Bausch tem tido o poder de simultaneamente atrair plateias ao redor do mundo e ultrapassar as barreiras de língua e de cultura, sensibilizando multidões com seus trabalhos controversos, polêmicos e excêntricos. Tem sido sua característica peculiar a criação de peças baseadas no estudo de um país e de um povo em específico.

De Istambul à Hong Kong, do Brasil a Lisboa, não importa em que ponto do mundo, Pina Bausch vem captando ao longo das suas últimas obras, e fruto das suas residências artísticas, a essência dos lugares e dos seus habitantes. São as cores, cheiros, texturas, sabores, os sons e a música, que marcam a sua impressão desses lugares muito além do visível, e curiosamente, com um humor que não aparecia em obras mais antigas.

De maneira geral, as obras de Pina Bausch apresentam algumas características marcantes e que podem ser pontuadas, como exemplos:

  • Repetição de movimentos;
  • Uso da voz e dos sons do próprio corpo;
  • Improvisação;
  • Movimentos do cotidiano;
  • Movimentos abstratos ou puros usados de forma narrativa, cômica ou mais abstrata;
  • Efeito de distanciamento e momentos cômicos inesperados;
  • Aproximação do real, contra uma representação formal e artificial;
  • Técnicas de colagem;
  • Reflexão sobre as relações humanas;
  • Caos grupal, favorecendo o processo sobre o produto;
  • Uso de elementos do teatro, como cenários, textos, construção de uma dramaturgia;
  • Grandiosidade no quadro cênico ( roupas e maquiagens) que definem papéis sexuais e sociais;
  • Quebra de expectativa no público para movimentos virtuosísticos;
  • Uso do exagero e do absurdo;
  • O corpo é usado para estimular a nostalgia;
  • Não recusa a técnica do ballet, usando-a sim de um forma crítica;
  • Aproveita a experiência de vida dos atores bailarinos;
  • Coloca ações diferentes de forma simultânea no palco;
  • Usa de movimentos repetitivos e estranhos para demonstrar que bailarinos também tem conflitos, não sendo seres “perfeitos”;
  • Transitoriedade de significados em cena;
  • Constante incompletude, busca e transformação em um pensar, sentir, fazer, fragmentado, ao invés de integrado.

Bibliografias de Pina Bausch

. FERNANDES, Ciane. Pina Bausch e o wuppertal dança teatro: Repetição e transformação. São Paulo:Hucitec, 2000.
. CYPRIANO, Fábio. Pina Bausch. São Paulo: Cosac Naify. São Paulo, 2005
. CALDEIRA, Solange Pimentel. Pina Bausch, um novo paradigma?
Dissertação de Mestrado, Defendida em novembro de 2002. UNIRIO. RJ
. PEREIRA, Sayonara Sousa. Rastros do Tanztheater no Processo Criativo de ES-BOÇO.
Espetáculo cênico com alunos do Instituto de Artes da UNICAMP / Sayonara Sousa Pereira. – Campinas, SP: [s.n.] , 2007.
. HOGHE. R & WEISS. U, Bandoneon: em que o tango pode ser bom para tudo?. São Paulo: Attar, 1989

Internet
www.pina-bausch.de
www.ballet.co.uk/
profile.myspace.com

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